A Defensoria Pública da União (DPU) recomendou a remoção de homenagens a escravocratas, racistas e eugenistas em monumentos e nomes de locais públicos, argumentando que a medida representa uma reparação histórica à população negra. O documento, elaborado pelo Grupo de Trabalho de Políticas Etnorraciais da DPU, enfatiza a necessidade de revisar o papel dessas personalidades na história e reforça a legalidade da proposta.
A iniciativa surgiu após a DPU ser convidada a participar de uma audiência pública sobre uma ação popular em São Luís (MA), que questiona a homenagem ao psiquiatra Raimundo Nina Rodrigues. O médico, falecido em 1906, defendia teorias que patologizavam crimes e contribuíam para a criminalização de grupos vulneráveis, especialmente negros e indígenas. “O pensamento racial e eugenista foi a base de sua doutrina, e não um acidente em sua obra”, aponta a nota da DPU.
Para Iêda Leal de Souza, integrante do Movimento Negro Unificado, a proposta da Defensoria busca corrigir distorções históricas. “O que ele estudou abalou a humanidade de um grupo racial vítima da escravidão. Não é apagar a história, mas colocá-la no lugar certo, garantindo que as pessoas conheçam a verdade sobre esses falsos heróis”, afirma.
O documento também destaca que a retirada de homenagens não significa esquecimento, mas sim a reafirmação da memória sob uma perspectiva mais justa. “O que se quer é recompor a verdade, lembrar o que de fato ocorreu e redescobrir o que até aqui foi negado enquanto memória da violação dos Direitos Humanos”, diz a nota técnica. A DPU utiliza o conceito de justiça de transição, aplicado a regimes autoritários, para repensar os impactos do legado escravista na sociedade brasileira.
Para Jacque Cipriany, advogada e articuladora da Rede de Proteção e Resistência ao Genocídio, o debate precisa ir além de casos pontuais. “Vivemos em uma sociedade estruturalmente racista. Manter homenagens a figuras racistas reforça essa lógica e perpetua a exclusão da população preta, cujas vozes e corpos foram historicamente silenciados”, afirma.
A proposta da DPU se baseia em compromissos assumidos pelo Brasil, como a adesão à Convenção da ONU sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial. Segundo a Defensoria, a retirada de homenagens representa um posicionamento claro do Estado brasileiro de que não compactua com símbolos que reforcem a desigualdade racial e a violência histórica contra grupos vulnerabilizados.
*Com informações da Agência Brasil.