O POTI utiliza o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, comemorado hoje, 10 de setembro, para trazer dados e informações sobre o tema
O continente americano registrou um crescimento de 17% na taxa de suicídio de 2000 a 2019, tornando-se a única região da Organização Mundial da Saúde (OMS) a testemunhar um aumento. Entre 2015 e 2019, quase 100 mil pessoas morreram por ano nas Américas, “o suicídio é uma preocupação significativa de saúde pública para a região”. As informações são do doutor Jarbas Barbosa, brasileiro que ocupa o cargo de diretor da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), em vídeo divulgado na última sexta-feira (8), com sua mensagem oficial para o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio (10/09).
Em 2019, o suicídio se destacou como a quarta principal causa de óbitos entre jovens com idades de 15 a 29 anos em escala global. Embora as mulheres tenham uma probabilidade mais elevada de tentar o suicídio, os homens apresentam uma maior taxa de conclusão do ato, registrando-se 3,5 vezes mais mortes de homens por suicídio em relação às mulheres na mesma faixa etária. Além disso, as evidências disponíveis destacam um impacto desproporcional do suicídio em grupos vulneráveis, como as populações indígenas e os indivíduos LGBTQI+.
Confira o pronunciamento do Dr Jarbas Barbosa, diretor da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS):
No Rio Grande do Norte
Trazendo o tema para a realidade local, é notável um aumento expressivo de preocupação com a depressão por parte dos profissionais de saúde mental em Natal. Um levantamento divulgado em abril de 2022 pelo Ministério da Saúde, destaca a cidade como a segunda capital do Nordeste com o maior percentual de adultos, com 18 anos ou mais, que afirmaram ter recebido um diagnóstico médico de depressão.
Natal apresenta um registro de 11,8% nessa categoria da população, ficando atrás apenas de Recife, com 12,5%, de acordo com os dados compilados pelo Ministério por meio da Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) referentes ao ano de 2021. A depressão é responsável por 96,8% dos casos de suicídio, inclusive entre os mais jovens.
No intervalo de 10 anos, entre 2012 e 2021, a região Nordeste do Brasil registrou 28.555 mortes causadas por lesões autoprovocadas. Dessas, 1.893 aconteceram no Rio Grande do Norte. Os dados são do DataSUS, sistema do Ministério da Saúde.
Confira os dados de mortes por lesões autoprovocadas na região Nordeste:
Para o psicólogo e conselheiro do Conselho Regional de Psicologia do Rio Grande do Norte (CRP/RN) Rômulo Raulino, a ignorância e o preconceito acerca da saúde mental dificultam a vida de pessoas que vivem em sofrimento psíquico.
“Ainda temos um cenário em que pessoas que estão em sofrimento psíquico são interpretadas como pessoas que não têm Deus no coração, que são fracas, que não se esforçam dentro do que poderiam. Então, há uma responsabilização, onde, muitas vezes, eles são vítimas de situações que não têm controle, e, nesses estigmas, é como se eles fossem punidos uma segunda vez. Há as condições que levaram ao adoecimento, e quando estão adoecidos ainda há uma cobrança do porque eles estão adoecidos”,
Rômulo Raulino, psicólogo e conselheiro do Conselho Regional de Psicologia do Rio Grande do Norte (CRP/RN).
Além dessas situações, ele lembra que hoje há uma preocupação “extra” por causa das redes sociais, que segundo o psicólogo, podem oferecer resoluções não saudáveis para lidar com os problemas do dia a dia
Angústia vivida de perto por pessoas que lutam contra pensamentos autodestrutivos dia após dia, relata Maria (nome fictício), estudante universitária, de 20 anos, que sobreviveu a uma tentativa de suicídio.
Para ela, “as redes sociais têm um papel muito cruel, porque criou-se uma cultura de que as pessoas são intocáveis”, fazendo com que a incitação ao suicídio seja uma prática “recreativa” no meio online.
O psicólogo Rômulo Raulino lembra que é importante ficar atento aos sinais e comportamentos apresentados por pessoas que estão em sofrimento psíquico. Ele diz que apesar de cada caso ser único, existem atitudes que servem como alerta:
- Isolamento;
- Retração social;
- Recaída em comportamentos disfuncionais, como abuso de álcool, comida e, até mesmo, sexo;
- Mudanças de humor, quando a pessoa fica mais irritadiça;
- Desenvolvimento de conflitos interpessoais.
Rômulo explica, ainda, que existem diversas formas de ajudar pessoas que estão nesse tipo de sofrimento. De acordo com ele, esses indivíduos sempre procuram alguém para desabafar.
“Muitos colegas, amigos e parentes podem nos procurar para falar de um pensamento negativo e/ou destrutivo e isso, muitas vezes, gera incômodo. As pessoas tendem a não se disponibilizar para falar, elas dizem três ou quatro coisas e encerram o assunto. Isso é muito hostil para alguém que já está vivenciando um sofrimento. Então, a primeira resposta que nós podemos ter é acolher, ter tolerância e disponibilidade para entender que a pessoa não está passando por aquilo por escolha”.
Acolhimento. Isso foi o que Maria encontrou ao perceber que não poderia lidar sozinha com a ansiedade e se reconectar com a realidade.
“Vi que precisava de ajuda e tudo mudou. Eu tive o apoio, principalmente, da minha família e de amigos próximos”.
Contudo, ela faz uma alerta: “as pessoas não estão preparadas para lidar com suicidas e acabam falando ou opinando de maneira que pode até mesmo atrapalhar o tratamento. O ideal é sempre perguntar: eu posso te ajudar?”
Maria deixa claro que apenas o cuidado e o respeito de pessoas próximas não é o suficiente, é necessário procurar uma ajuda profissionais, assim como o psicólogo Rômulo Raulino também orienta.
“Existem algumas linhas de cuidados mais fortes, como o Centro de Valorização da Vida (CVV), os serviços escolares para a população que não consegue acessar os serviços particular ou público”.
Setembro Amarelo
A data é organizada pela Associação Internacional para a Prevenção do Suicídio (IASP) e conta com apoio da Organização Mundial de Saúde (OMS). No Brasil, o Setembro Amarelo marca o mês dedicado à prevenção ao suicídio. A iniciativa nacional é do Centro de Valorização da Vida (CVV), da Associação Brasileira de Psiquiatria e do Conselho Federal de Medicina. Por isso, durante todo o nono mês do ano, repartições públicas e privadas aderem à campanha.
Contudo, é necessário que o assunto seja tratado durante todo o ano para que se crie efetividade nas políticas públicas de saúde mental.
“Há a importância da mídia trazer esses assuntos referentes a saúde mental e de prevenção ao suicídio durante todo o ano, não ficando concentrado apenas no mês de setembro ou em janeiro, quando ocorre a campanha do Janeiro Branco (mês de conscientização sobre a Saúde Mental). Eu acho que construir espaços perenes de discussão e reflexão, em trabalho conjunto com os profissionais de saúde mental talvez seja uma contribuição muito importante que a mídia possa dar sobre esse tema”, afirma o psicólogo Rômulo Raulino.
O mesmo é defendido por Maria: “Pessoas com transtornos mentais existem e precisam de coisas reais e que tragam um pouco de conforto o ano todo”.
Onde procurar ajuda:
O Centro de Valorização à Vida (CVV) oferece atendimento especializado online, através do site ou do e-mail, pelo telefone 188, e de forma presencial. No Rio Grande do Norte, o CVV tem endereço físico nas cidades de Natal (Av. Junqueira Aires, 390 – Cidade Alta), e Caicó (Praça Dom José Delgado, nº 51, Bairro Paraíba).
O Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza atendimento para pessoas em sofrimento psíquico por meio dos serviços da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). Diferentes níveis de complexidade compõem o cuidado, sendo os CAPS – Centro de Atenção Psicossocial, em suas diferentes modalidades, pontos de atenção estratégicos da RAPS. Também estão disponíveis as Equipes Multiprofissionais Especializadas em Saúde Mental (AMENT), que têm como objetivo atender casos moderados de ansiedade e depressão.
Além disso, existem os atendimentos oferecidos pelas instituições de ensino, como a Universidade Federal do Rio Grande do Norte e a Estácio. Em ambas é necessário fazer inscrição de acordo com o número de vagas.
Edição: Larissa Cavalcante.