Por Louise Chacon
“A gente quer que o progresso venha, mas queremos que ele venha pensando no trabalhador da Redinha”, afirma Carla Suely, liderança dos pescadores locais.
Quase dois meses após as demolições dos quiosques da praia da Redinha, localizada na Zona Norte de Natal, trabalhadores do local reclamam das incertezas econômicas e dos impactos na região. Os quiosques foram derrubados com o objetivo de continuar as obras do Complexo Turístico da Redinha. Com um orçamento de R$ 25 milhões, por meio de uma parceria entre a Prefeitura de Natal e o Governo Federal, ele prevê a criação de novas estruturas para a tradicional praia, como a reforma do novo Mercado da Redinha, criação de novos acessos, iluminação pública e construção de quebra-mar. Porém, o planejamento não incluiu uma solução para a permanência dos quiosques que já ocupavam o lugar há décadas.
Agora, após as demolições, não só quiosqueiros como também outros trabalhadores da região, pescadores e ambulantes por exemplo, relatam as inseguranças e insatisfações em relação à obra e o modo como ela está afetando a dinâmica de trabalho na praia da Redinha. Essas contestações em relação à falta de participação da população local nas decisões do Complexo Turístico estão presentes desde o início do projeto.
Maria da Silva, de 62 anos, conhecida na região como Dona Neném e integrante do Coletivo Ginga com Tapioca – que surgiu para discutir as demandas do caso –, já trabalhava há 33 anos na praia, e é uma das pessoas que teve o quiosque derrubado. Ela conta que a comunicação da Prefeitura de Natal com o grupo local em relação às obras na Redinha sempre foi ausente. “Infelizmente, nesta gestão municipal, nunca fomos comunicados de nada […] ficamos sabendo da retirada dos quiosques por meio de uma advogada”, afirma.
Impacto econômico
Segundo os trabalhadores locais, a retirada dos quiosques já está impactando significativamente a base da economia na região: a pesca. “Na Redinha, a pesca é a principal fonte de renda. Por meio dela, foram levantados os quiosques e o mercado público. Através da pesca se levantou toda uma economia do bairro da Redinha”, afirma Carla Suely, de 45 anos, liderança dos pescadores da Redinha, “[…] e hoje essa economia está totalmente prejudicada”, lamenta.
Carla ainda afirma que a reação da população local é de revolta, e que as obras não estão sendo vistas com bons olhos:
“São mais de 4 anos pra praia ficar urbanizada como está no projeto. Até lá, como vamos sobreviver, sustentar nossas famílias?”.
Carla Suely, liderança dos pescadores da Redinha.
A retirada dos quiosques também impacta diretamente a cadeia econômica local, visto que eram eles os principais responsáveis por trazer os clientes, inclusive turistas, para a região. “Se você só remove toda essa estrutura, então as pessoas param de ir para a praia. Sem quiosques, não tem mais para quem o ambulante vender, nem um lugar onde o pescador possa comercializar o peixe”, explica Pedro Levi, advogado do Centro de Referência em Direitos Humanos Marcos Dionísio (CRDHMD) e que está acompanhando o caso.
Indenização
Dez dos vinte comerciantes que possuíam ponto no local aceitaram receber uma indenização de R$ 50 mil, definida pela Justiça em audiência de conciliação. Já os outros dez decidiram por aceitar a metade do valor, R$ 25 mil, e ter o direito de voltar a ter um quiosque na praia, apesar de ainda não haver a garantia da reconstrução desses espaços, segundo os quiosqueiros.
Porém, de acordo com Pedro Levi, os valores são insuficientes. “A indenização aparece para recompensar o tempo que as pessoas não poderão estar na praia trabalhando, mas ela não supre toda a demanda que surge com a saída dos quiosques, como a demissão de cozinheiras e garçons. Houve um conjunto de trabalhadores desempregados”, explica.
“Lutamos pela retomada da cadeia econômica, social e cultural da praia. Existe uma importância cultural gigantesca ali. A praia da Redinha tem essa característica: é o povo da Zona Norte que utiliza, então há elementos culturais da vida e do cotidiano da periferia de Natal, que se dá na beira dos quiosques”.
Pedro Levi, de 25 anos, advogado do Centro de Referência em Direitos Humanos Marcos Dionísio (CRDHMD).
Os quiosques já foram todos removidos, mas há um processo judicial que segue em mediação na Justiça Federal que tenta minimizar os impactos da obra, mas que acima de tudo solicita a reconstrução dos pontos derrubados, com o objetivo de retomar a lógica de trabalho com a qual a Redinha contava anteriormente.
O POTI entrou em contato com a Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seinfra) em busca de informações sobre propostas para realocar os trabalhadores dos quiosques em outras áreas e indagando a respeito da previsão de permanência desses trabalhadores após a construção do Complexo Turístico da Redinha, mas não obteve respostas. Ao ser questionada, a Secretaria também não informou se a população foi convidada a participar das decisões do projeto.
Protesto
Os vendedores e vendedoras ambulantes da Praia da Redinha, realizaram na manhã desta sexta-feira (18) um protesto contra a proibição imposta pela prefeitura da capital para o trabalho na areia da praia. A mobilização contou com apoio dos mandatos do vereador Daniel Valença e da deputada federal Natália Bonavides.
Os ambulantes foram retirados da praia na última quinta-feira (17) pela guarda municipal e outros servidores da prefeitura. Eles receberam uma notificação determinando a saída imediata do local, que é seu único lugar de trabalho.
De acordo com os vendedores, ninguém foi previamente notificado sobre essa ação da Prefeitura de Natal. No momento em que os servidores do Município chegaram e determinaram a desocupação, havia, inclusive, clientes sendo atendidos pelos trabalhadores.
Edição: Larissa Cavalcante.