O mês de outubro é um período de intensa mobilização em prol da contínua luta pela despatologização das identidades trans. Mais especificamente, no dia 21 de outubro, celebramos o Dia Mundial de Luta contra a Patologização da Transexualidade, um movimento que está intrinsecamente ligado à busca pela remoção da transexualidade do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Norte-Americana de Psiquiatria e da Classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial da Saúde.
Em 2019, essas lutas alcançaram um importante marco com a retirada da transexualidade e travestilidade da lista de doenças e problemas relacionados à saúde no sistema de Classificação Internacional de Doenças (CID), representando um passo significativo na despatologização dessas identidades. No entanto, é fundamental ressaltar que ainda enfrentamos o desafio de combater o preconceito e a violência que, lamentavelmente, continuam a ceifar vidas dentro dessa comunidade diariamente.
Aproveitando a data, O POTI traz hoje uma matéria sobre a emocionante história de Mell Almeida, uma mulher trans determinada a quebrar barreiras e encontrar seu espaço no jornalismo potiguar.
Desde a infância, Mell Almeida carregava consigo um sonho singular: ser apresentadora infantil. Ela era aquela criança que gostava de se comunicar, que falava pelos cotovelos e, de alguma forma, tinha um dom natural para a comunicação. No entanto, seu caminho seria marcado por desafios e uma jornada de autodescoberta que a levaria a uma realidade inesperada.
Mell cresceu em Macau, uma cidade pequena do Rio Grande do Norte, onde os recursos eram escassos, e a realização de sonhos muitas vezes parecia um horizonte distante. Seus pais não podiam pagar uma faculdade, mas isso nunca a impediu de ser corajosa e determinada. Ela se via desafiada constantemente, mas sempre recusava aceitar limitações impostas pelos outros.
“Eu vou para onde eu quero ir”, diz Mell com determinação, relembrando os momentos em que lhe disseram que não conseguiria alcançar seus objetivos. Quando disseram que ela não se formaria, ela foi lá e conquistou seu diploma. Quando disseram que ela não poderia fazer algo, Mell provou que podia.
O jornalismo, para Mell, sempre representou uma quebra de tabus. Ela nunca viu alguém como ela na TV fazendo jornalismo autêntico. O máximo que via eram pessoas trans em papéis secundários ou fazendo comédia. Ela sonhava em ser uma jornalista de verdade, alguém que pudesse informar, educar e inspirar.
Mell iniciou sua carreira na TV Futuro, onde teve sua primeira oportunidade durante a transmissão do Carnatal, um dos maiores eventos do Rio Grande do Norte, propagado ao vivo para todo o estado. Ali estava ela, ao vivo no horário nobre, realizando um trabalho que sempre pareceu um sonho distante.
No entanto, Mell entende que sua jornada não é apenas pessoal. Ela acredita que sua experiência ressoa com outras pessoas trans que enfrentam barreiras semelhantes. Ela questiona quantas pessoas como ela vemos na TV fazendo jornalismo sério e autêntico.
“Existe uma distância entre a mídia e as pessoas trans”, diz Mell. “Há um estigma, e acho que isso é notório. Eu tenho uma pergunta para você: quantas pessoas como eu você vê na TV? E não estou falando de vitimismo, pois sempre tive a coragem de enfrentar e vencer os obstáculos que a profissão nos impõe. No entanto, ainda somos muito marginalizadas.”
Mell fala sobre a necessidade que as pessoas trans têm de provar repetidamente sua capacidade, mesmo com currículos invejáveis, enquanto indivíduos cis muitas vezes recebem prioridade nas oportunidades.
“Existe um estigma, principalmente na TV, e essas mesmas emissoras falam sobre diversidade, mas não a praticam. Será que você se sente representado na TV? Isso falta nos veículos de comunicação: abrir os olhos para a diversidade e mostrar novos talentos, independentemente da orientação sexual de qualquer indivíduo, que, muitas vezes, têm seus talentos silenciados.”
A história de Mell Almeida é uma jornada de resiliência, coragem e determinação para superar obstáculos e criar oportunidades. Ela representa não apenas a si mesma, mas também todas as pessoas trans que aspiram a quebrar barreiras e conquistar seu espaço na mídia brasileira. Mell nos lembra da importância da diversidade e da inclusão, e como a representatividade é fundamental para que todos os talentos brilhem, independentemente de quem são e de onde vêm.