Marco temporal: o que é e o que ficou definido pelo STF - O POTI

Marco temporal: o que é e o que ficou definido pelo STF

Durantes meses, os povos indígenas se manifestaram contrários à tese do marco temporal em todo o Brasil e protestaram na Praça dos Três Poderes, em Brasília. Foto: Hellen Loures/Cimi.

Você pode ter lido ou escutado o termo “marco temporal” algumas vezes enquanto acompanhava notícias pelo celular, televisão, rádio e outros meios nas últimas semanas. Mas, assim como a maior parte dos brasileiros, talvez você não tenha entendido do que se trata o tema ou o que ficou decidido sobre o mesmo. Afinal de contas, o que é o marco temporal, por que os povos indígenas são contrários e como o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou a tese? 

O que é o marco temporal e como os povos indígenas veem a proposta

O marco temporal é uma tese e proposta jurídica na qual fica definido que os povos indígenas do Brasil têm direito a ocupar apenas terras e territórios que já ocupavam ou disputavam na data em que foi promulgada a Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988. 

Ou seja, se um povo indígena não estava alocado em sua terra na referida data, ou não tinha comprovação legal na justiça de que havia um conflito acontecendo pelo território, os mesmos não poderiam reivindicar a demarcação do espaço. 

A tese surgiu em 2009, após um caso que aconteceu em Roraima. O argumento foi utilizado para tratar da demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol, em um parecer da Advocacia Geral da União (AGU)

Mas foi em 2013, no caso da Terra Indígena Ibirama LaKlãnõ, onde vivem os povos Xokleng, Guarani e Kaingang, em Santa Catarina, que o marco temporal se tornou um debate que poderia modificar as normas de demarcação no Brasil. Na época, a justiça federal no estado utilizou a tese para conceder ao Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina, a reintegração de posse de uma área que faz parte da Reserva Biológica do Sassafrás. É sobre este tema que o STF debate atualmente. 

Acontece, que os povos indígenas eram tutelados pelo estado em 88 e não tinham o autonomia e acesso à luta pelos seus direitos e terras. É importante mencionar, que os grupos foram duramente violentados pela ditadura militar que antecedeu a promulgação da nossa Constituição, o que dificultava as alocações e petições pelos territórios. 

Por conta disso, os povos originários se colocaram como completamente contrários à tese. Além dos fatores jurídicos, a luta indígena no Brasil afirma que não podemos esquecer que, antes de ser encontrado e colonizado pelos portugueses, o nosso país já era habitado pelos nossos ancestrais indígenas, que foram perseguidos, escravizados e dizimados. Há meses, os povos protestam em vários estados e na capital do Brasil, para que o marco temporal não seja posto em prática. Em Natal, o Forte dos Reis Magos chegou a ser alvo de uma das manifestações.

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Para as lideranças indígenas, a proposta seria uma maneira de dificultar demarcações, tornando-se uma tese que beneficiaria ruralistas em busca de terras para plantio.  

Vigília realizada em agosto deste ano, em frente ao prédio do STF. Foto: Scarlett Rocha.

O que o STF decidiu sobre o marco temporal?

Homens, mulheres e crianças indígenas acompanharam o julgamento no plenário do STF. Foto: Vinicius Schmidt/Metrópoles.

O Supremo Tribunal Federal formou maioria e deu o seu entendimento sobre o marco temporal nesta quinta-feira (21). Por 9 votos a 2, a Suprema Corte rejeitou a tese da justiça federal em Santa Catarina. Por ser um recurso com repercussão geral, a decisão passa a valer para casos semelhantes em todo o país. 

Em resumo, isso significa que o argumento do marco temporal foi julgado como inconstitucional pelo STF. 

Apenas os ministros André Mendonça e Nunes Marques votaram a favor da tese. Nos argumentos dos demais membros da corte, que votaram contra, foram mencionadas questões de direitos fundamentais, ancestralidade e posse tradicional.

Agora, o plenário da Corte deve fixar os parâmetros que servirão para definir ao menos 226 casos semelhantes que estão suspensos no país. 

A decisão foi comemorada por membros de diversos povos indígenas que acompanharam o julgamento de perto em Brasília e, após a resolução, entoaram cânticos e fizeram danças tradicionais em frente ao prédio do STF, confira:

Edição: Naryelle Keyse.